Sunday, September 22, 2013

O dublê



Dublê é aquele indivíduo que faz as cenas perigosas dos filmes de cinema e televisão.
Acho que toda pessoa deveria ter o direito a um, mocinhos e mocinhas que somos, dos filmes de nossas vidas.
As mulheres, por exemplo, poderiam ter sua dublê naqueles dias do mês.
A dublê sofreria as agruras da TPM e passaria todo o ciclo menstrual no pequeno inferno astral que acomete todas as Penélopes do mundo.
Na gravidez, a dublê seria fundamental.
Enquanto a dublê estivesse engordando, ganhando estrias e tendo desejo de comer doce de jaca às duas da manhã, a mocinha estaria se bronzeando em Bali.
Quando um político tivesse que ir a uma coletiva para explicar um escândalo como o do mensalão, o dublê iria em seu lugar.
O dublê responderia às perguntas irritantes dos jornalistas.
O dublê se constrangeria.
O dublê receberia as vaias na saída.
Enquanto isto, aquele que ele estiver representando poderá estar numa igreja rezando, pedindo perdão a Deus. Ou fazendo mais uma negociata, conforme for a sua vontade.
Ao dublê do goleiro que leva um frango, estariam reservados os apupos.
Ao similar do amante que falha na hora do amor, a frustração, as mãos à cabeça e a obrigatoriedade do bordão "isto nunca me aconteceu antes"...
Ele buscaria a sogra no aeroporto às cinco da manhã. E conviveria com ela pelos próximos cinco meses.
O dublê levaria o pé-no-traseiro, da namorada.
Ele encontraria, na cama, a esposa infiel e seu amante.
Dublê de sujeito casado com mulher feia, ou vice-versa, receberia em dobro.
Vida de dublê não é fácil.
Mas o meu não teria grandes assombrações. Não teria que se atirar de penhascos, saltar de paraquedas ou participar do capotamento de um veículo durante intensa fuga policial.
Mas seria a ele seguir as recomendações do meu médico.
Ele comeria os vegetais e as frutas diariamente.
Ele caminharia os 5 quilômetros receitados todas as manhãs.
Ele faria a dieta.
Ele ficaria abstêmio.
Enquanto isto, eu estaria em meu bar favorito, comendo picanha, lingüiça, bebendo chope gelado e fumando uns cigarrinhos.
Meu dublê amarraria meus sapatos, todas as manhãs.
Ele faria o tratamento de canal, no dentista.
Ele iria ao proctologista todos os anos, fazer ‘aquele exame’ de rotina.
Afinal, já passei dos quarenta.
Ele me representaria em almoços realizados em restaurantes vegetarianos e beberia cerveja sem álcool.
Ele assistiria todas as derrotas do meu time.
No show de Zezé di Camargo e Luciano em Jaguariúna, imposição de um compromisso profissional meu, ele injetaria breganejo nas veias.
Ele votaria em Lula.
Ele faria aula de dança de salão e saxofone, duas frustrações, dois desejos meus, não realizados por mera preguiça.
A coisa só se complicaria um pouco mais para o lado dele, quando chegasse a minha hora de partir dessa pra uma pior.
Enquanto Ele estivesse prestando contas a Deus pelos pecados que cometi, Eu estaria em casa, largadão no sofá, lendo um livro, ou simplesmente exercitando os dedos no controle remoto da televisão.


27 comments:

Luciana Marinho said...

rs tadinho... o dublê também teria direito a ter o seu dublê, como todas as pessoas, né não?

beijão, roberto!

ps. obrigada pela graça e pelos minutos de alívio ao pensar o que eu reservaria ao meu dublê ^^

Unknown said...

este é o cara o resto é só o resto




abração

Primeira Pessoa said...

Ah, Luciana, mas nós estamos doidinhos pra saber o que você pediria ao seu dublê.

Beijão do

R.

Primeira Pessoa said...

este carta é o resto, zé de assis...

tabajaríssimo...rs

abração do

r.

Anonymous said...

Tomar sol em Bali, me livrar da tpm: é quase tudo que eu quero pra hoje.
O resto é segredo...

Beijo, Beto e parabéns mais uma vez pelo lançamento do livro mundo afora :)))

Sônia Brandão said...

Você mexeu com a minha imaginação. Fiquei aqui pensando quais seriam as tarefas do meu dublê.

bj

Primeira Pessoa said...

sônia,
faz uma lista...
captar pose de passarinho, certamente seria uma delas... testemunhar parto de gerânios, outra...

tudo coisa boa.

beijão,

r.

Primeira Pessoa said...

drica,
estaremos juntos em BH pro lançamento no palácio das artes.
vamos combinando direitinho.

beijão,
r.

bell said...

Como disse o Assis ,este é o cara ! O resto...bom o resto seriam dubles !

Unknown said...

robertílimo,
imagino-te já de regresso aos states e a tanto de ti que tem a forma dessa terra sagrada.
o cheiro de cá, esse, não é mais o mesmo, porque nada permanece igual depois de mexido. as saudades reafirmam o tempo, não o que nos escapa, mas o nosso, o tempo-homem com o qual nos tornamos inteiros e maiores.

definitivamente há tanto para sempre...

abraço vivo neste dia em que um dos maiores desafia o grande verso - a eternidade: antónio ramos rosa.

Primeira Pessoa said...

Jorgíssimo,
amigo querido, no dia em que você inaugura uma nova primavera (no renascimento da dita-cuja, assim o diria, umas três estrellas de galliza a escorregar goela abaixo) um dos maiores mestres cisma de nos deixar para virar zelação.


semana passada, você e eu falávamos dele. lembra?

naquele dia, já não podíamos adiar o coração.

assim sendo, a partir desta data, ramos rosa falará pela sua boca, moço de bracara augusta, e o mundo dirá amém.

amém, já o digo.
testemunho e dou fé.

abraço daquele seu irmão montanhês,

aquele amigo de roberval taylorrrrrrr.

r.

Primeira Pessoa said...

bell, assis, sim, este é o cara.

um deles.

admiro, mais que demais.

beijão,

r.

Rindo de nervoso... ainda said...

Bem faço eu que todas as manhãs passo a titularidade para a imagem que me copia no espelho. E fico dublê, à espera depapel.

Tania regina Contreiras said...


Hoje eu bem que precisei de uma dublê pela manhã, quando acordei. Seria a hora em que o dublê seria mais utilizado: ele acorda e eu durmo! :-)

Sempre gostosas demais suas crônicas. Bjo

Celi - Chef em Casa said...

Roberto,
voce não faz ideia de como seu texto foi comovente pra mim. Lembrou-me outro muito mais triste (a palavra talvez seria pungente, do Vargas Lhosa). No momento esqueci o nome do livro mas vou "fuçar" minha biblioteca e lhe mando se voce permitir. No mais, ansiosa por conhece-los no lançamento do Meninos... em BH (Oi, sou Celi, prima da Lina Mendes, também de Mutum)




cirandeira said...

Sei não, Roberto, mas desconfio que
nos autodublamos todos os dias mesmo que não percebamos :)

um beijo

Dois Rios said...

Gostei, ainda que ache que temos mais é que passar pelos apuros, desgostos e dores na vida para sentirmos o doce gosto da alegria, quando ela se acercar.

Bjos.

Tuca Zamagna said...

Estou à caça de um dublê há três anos, quando meu médico me receitou caminhar 5 km três vezes por semana, Beto. Até agora nada, não é fácil xerocar uma coisa amarfanhada que nem eu. O jeito é improvisar, esticando o contrato com o moleque favelado que dá voltas na lagoa usando o crachá "Tuca"...

Até mês que vem, em Beagá.

Beijão

na vinha do verso said...


hi
eu que ando salvando
a pele do meu dublê
rs

Primeira Pessoa said...

marquinho,
seu poste ta fazendo xixi no cachorro.

beijão,

r.

Primeira Pessoa said...

tuca,
seu dublê teria mais trabalho que o do cantor lobão, por exemplo. Segundo a mãe diná, seu dublê é uma reencarnação do dublê de tim maia.
vou iniciar uma campanha pelo aumento de salário do seu dublê.

abs,

r.

Primeira Pessoa said...

é que viver, às vezes, dói um pouquinho, bela inês.

beijão,
r.

Primeira Pessoa said...

cirandeira,
eu vivo todo ralado.
dublê deve ser que nem papai noel, né?

beijos,

r.

Primeira Pessoa said...

celi,
sera uma grande alegria vê-la no lançamento de Meninos de São Raimundo, em BH.
celebraremos!

beijão,
r.

Primeira Pessoa said...

taninha,
seu dublê teria a cor roxo-violeta, seria zen, aproximaria as pessoas.

seria uma dublê bacana demais.

beijão,

r.

Primeira Pessoa said...

paulinho saturnine,
e "fico dublê à espera de um papel" é uma frase e tanto.

contigo, aprendo.

abração,
r.

Primeira Pessoa said...

Luciana,
dublê do dublê equivaleria ao vice do vice.

será que haveria interessados nesta vaga?

sei não...rs


beijo grande,

r.