Friday, August 7, 2015

Os carecas


Os carecas voltaram. Andam pelas ruas de Nova York e do mundo, másculos, decididos, fazendo as moças suspirar por onde eles passam. Fazem um estilo próprio, parecem ter uma linha de roupas criada especialmente para eles. Alguns usam brincos, outros mostram tatuagens épicas que poderiam ornamentar a parede de um museu. São perfumados.

Eles são modernos, pós-modernos, chegaram ocupando o espaço que até pouco tempo era dos metrossexuais, aquela turma bonita que depila o peito e usa camisas apertadinhas, insinuando o tanquinho do tórax e mostrando os bíceps esculpidos em academias. Rei morto, rei posto.
Não tenhamos dúvida: é a vez dos carecas.

Mas nem sempre foi assim. Houve um tempo que os carecas não eram tão bem vistos e chegavam a ser discriminados, objetos de comentários maldosos, tornando-se uma espécie de ponto de referência:
    “Lá na frente. Ao lado do careca”.

Num século que parece distante, houve quem escrevesse uma marchinha de carnaval como forma de redenção da classe. Com o evento das micaretas e o fim do carnaval de salão apenas os mais antigos se lembrarão do refrão daquela música de duplo sentido que garantia que é dos carecas que elas gostam mais. Fora do carnaval, nem sempre foi bom para os carecas.
Telly Savallas, o Kojack, e Yul Brynner, um dos irmãos Karamazov, foram os primeiros carecas amados e reverenciados de que tenho notícia. Com o passar do tempo vieram outros de indiscutível carisma, sendo Michael Jordan o mais amado de todos.

Hoje, muitos cabeludos raspam a cabeça por questões estéticas, para fazer parte da nova tribo. Mas não tenho dúvida de que a grande maioria raspa completamente, numa espécie de tratamento de choque para o que antes era um problema e que agora virou charme. Assim que os cabelos começam a cair, o sujeito vai à farmácia e compra uma gilete. Fim de papo.

Não existe mais aquela preocupação de esconder a falta de cabelos, hábito que existe desde o começo das coisas. Há registros históricos de que no Egito antigo recomendavam que se aplicasse no couro cabeludo a mistura de partes iguais de gordura de leão, hipopótamo, jacaré, cabrito e cobra. O imperador romano Júlio César (100-44 a.C.) sonhava recuperar seus cabelos utilizando-se de uma receita nada convencional constituída por ratos domésticos queimados, dentes de cavalo, gordura de urso e vísceras de veado.
Eu não sou imperador de nada, mas já tentei de tudo. Xampu de jaborandi, azeite de oliva, poções milagrosas vendidas por camelô de porta de estação rodoviária e, ultimamente, ando as voltas com uma espuma mágica receitada por um dermatologista. A cada dia que passa, eu tenho menos cabelos onde deveria ter, e constato a existência de cabelos onde não deveria ter.
Então eu decidi que - se os carecas continuarem em voga até o fim deste verão - irei raspar tudinho. E já escolhi uma tatuagem tribal para o braço esquerdo e adquiri um par de brincos de diamantes de mentirinha. 
Senhoras e senhores, se até o final deste verão não surgir uma nova fauna de ‘descolados’ na humanidade, este ex-jovem semicareca vai andar absolutamente na moda.

Quem viver verá.

17 comments:

Lu Dantas said...

É verdade! Eles voltaram!
Grande abraço

www.lucadantas.blogspot.com.br

Primeira Pessoa said...

... e cheios de estilo.

abração, Lu Dantas

R.

Roberto Schiavon said...

Também vou nessa, Xará! :)

ÍndigoHorizonte said...

Vuelvo por aquí después de tanto tiempo ya. Y vuelvo a sonreír.

Abrazo de esta mulher de la Mancha de cuyo nombre no quiero acordarme.

Primeira Pessoa said...

Mulher de La Mancha,
penso sempre em você. Jamais me esquecerei de que viajou de tão longe - levando os piões de seus filhos - para que Bispo e eu pudéssemos abraçá-la em Santiago de Compostela.
Foi tudo muito corrido e carrego comigo a culpa de não termos desfrutado de mais tempo juntos, de não termos compartilhado um pedaço de pão e uma taça de vinho entre amigos.
Eu me prometi que voltarei aí e que nos veremos de novo. Levarei presentes e presence. Juro.

Abraço maior do

R.

Primeira Pessoa said...

Vem, xará!
Formaremos um ataque e tanto.

Abraços

R.

Carlos Borges said...

Muito bom, Beto!!!! Amei. Eu vivo com um Careca que, como voc6e bem descreveu, recentemente passou a não mais se achar feio por não ter cabelo. Até bem pouco tempo ele sonhava com uma cabeleira.

Primeira Pessoa said...

Carlinhos,
o Richard anda na moda já faz um bom tempo e se deu muito bem, não?
Saudades de quando passávamos horas desenterrando cantores de iê-iê-iê.

Abração,

R.

Sam said...

Olá Primeira Pessoa,

tu sabes que ao escrevermos um comentário no seu blog a letra com que escrevemos é igual a da antiga máquina de escrever? só por aí já dá vontade de comentar... muito esperto, se foste tu a pensar nisso.

as máquinas de escrever são do tempo em que ser careca era quase um crime capital, tal e qual descreve a sua ótima crônica.

aqui em sampa os carecas já dão as cartas. eu gosto, se a questão é gosto. gosto mais do que gostei dos metro....

semi careca é também coisa atraente, principalmente se "debaixo dos caracóis dos seus cabelos" houver um cérebro, o que me parece ser o caso do amigo.

abra
aço.

Eleonora Marino Duarte said...

Roberto,

bela análise da mudança de comportamento com relação aos carecas (é dos carecas que elas gostam mais?).
ainda bem que quando chegarmos ao ponto de não existir mais diferença entre homens e mulheres (o aparecimento do terceiro sexo) eu já terei morrido... porque me causa mesmo má impressão homem com cara de tudo, menos de Homem. sou preconceituosa?... tragédia! paciência.

adorei o texto.

beijo.

Primeira Pessoa said...

Eleonora,
minha companheira de viagens sem fim, eu comecei a escrever esta crônica com a intenção de contar um 'causo' ocorrido há cerca de um mês.
Peter Pantoliano (carecão assumido há mais de 10 anos) e eu jantávamos em um destes lugares descolados do Soho e observamos que havia oito carecas na sala, contando com ele. E falávamos da "macheza" que emanava dos carecas, todos eles carecas de boutique (teorizei), até que dois deles, bem grandões, tatuados e malhados, braços tatuados, começaram a se beijar languidamente na mesa ao lado da nossa.
Ri muito, porque aquilo deu início a uma outra discussão. Por um breve momento, os carecas voltaram a morar em uma marchinha de carnaval.

Beijão,

R.

Primeira Pessoa said...

Sam,
adoraria ter tido a idéia da fonte courier (acho que é este o nome) nos comentários, mas não fui eu :-)
Fico feliz pela sua mensagem, daquelas de dar vontade de responder com uma carta.
Volte sempre que quiser. A casa é sua.

Abs,

R.

Sam said...

Primeira Pessoa

Voltarei sim, pela simpatia sua e pela coisa da carta.

Abra
Aço

Eleonora Marino Duarte said...

Roberto, meu amigo de estradas nas estrelas
estou rindo aqui! :)

acontece :)

beijos.

Primeira Pessoa said...

Eleonora,
parcera de todas as viagens recôncovas e caatingueiras... cê fica ainda melhor quando sorri.

Beijão

R.

Primeira Pessoa said...

Sam,
você já sabe onde fica a chave, não?
Debaixo do vaso de flor.

Beijão

R.

Sam said...

Primeira Pessoa,

gentilíssimo o amigo.

bei
jão.