Tuesday, January 4, 2022

Patolino

(Para a Bebel)


Minha filha Bebel tem uma coisa com o número 11. Ela nasceu às 11:11 da noite do dia 27 de outubro de 2001. Tão logo descobriu o significado da palavra numerologia, encafifou-se.

Recentemente, ela fez uma tatuagem com esse número. Trata-se de um discreto desenho em seu braço direito, a uns cinco centímetros do punho.

Onze, dois pontos, onze.

No teto do seu quarto, bem na direção do travesseiro em que ela repousa a cabeça, tem uma frase escrita com caneta azul. Quando abre os olhos, todas as manhãs, ela pode ler:

11:11: The Hour of Power.

Se é o momento da força, eu não sei. 

Todas as vezes que eu olho o relógio e os ponteiros indicam que são onze e onze, eu me lembro dela.

E me lembro, também, de mim, e da estranha relação que tenho com o número 22.

- "22 é o dobro do número do seu 'número de estimação', digo sempre para minha filha.

Ela ri.

O que isso quer dizer?

Talvez nada, mas foi o meu número de soldado do exército brasileiro e na chamada da sala de aula nas escolas de Governador Valadares, ainda menino.

Vira e mexe, o nome e o número se reencontram.

E nada acontece.

Estiveram no passaporte e em mais de um cartão de crédito. E em outras situações.

No bingo, eu nunca ganhei com o 22.  Aliás, nunca ganhei.

Na loteria, sempre jogo o 22 e não ganhei absolutamente nada, além da certeza de que a loteria é uma arapuca de pegar bobo.


De superstição em superstição eu e minha filha vamos levando a vida. Tenho certeza de que não estamos sozinhos nesse barco furado, mas algo parece ter mudado. 

Eu, que há mais de 40 anos só uso cueca amarela na passagem do ano - sem receber o benefício do dinheiro abundante no novo ciclo -, resolvi chutar o pau da barraca e acabar com a tradição.

Aliás, prometi me libertar de vez de todas as mandingas.

Superstições?

Nunca mais!

No último dia 31 eu não comi 12 uvas, nem lentilhas. 

A roupa não era branca e a cueca - uma brincadeira de minhas filhas -, era mais colorida que um tambor do Olodum, com a estampa do Patolino bem no meio da bunda. 

Não saí por aí caçando uma praia para dar sete pulinhos.

Dispensei as três sementes de romã,

Nem fiz pedidos desoriginais em bilhetinhos de punho próprio para jogar ao vento.

Não que eu não queira emagrecer 5 quilos e não deseje que o Cruzeiro volte à primeira divisão, é claro que não.

Que não deseje o fim da pandemia.

Da carestia.

Da necessidade das pessoas entrarem na fila do osso, para escapar da fome.

E de muito mais.

Para completar o pacote anti-reveillon, fui dormir cedinho, após me empanturrar de ceviche num restaurante de Newark.

Não vi, nem ouvi, a queima dos fogos. Nem desejei feliz ano novo a ninguém. 

Morfeu não apareceu nos meus sonhos para brindar com champanhe e ainda tive um pesadelo com um imbecil andando de jet ski.

Normal.

Aterrissei em 2022 na mesma hora de sempre, tomei meu café-com leite e torrada e fiquei olhando os cachorros correndo no frio do quintal.

E aí o número 22 atravessou a paisagem, num galope.

Será que esse é o ano em que eu ganharei, finalmente, no bingo e na loteria?

Ou será que é o ano da minha morte?

Bati  três vezes na madeira da mesa.

Sai pra lá, assombração.

Vem 'nimim', 2022!

2 comments:

ÍndigoHorizonte said...

Benvindo 20 22! Abraço.

ana p said...

Ano bom, Roberto
Bj