Friday, November 20, 2009

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De Almas Gêmeas e outros Afins

Cada pessoa se encanta pelo que lhe enche o espírito. Ou pelo que lhe salta aos olhos. É raro quando encontra-se alguém tão parecido com nós próprios, e é nessa situação que aparecem as chamadas almas gêmeas, as grandes amizades, os grandes amores.
Mesmo nas diferenças, essas pessoas “iguais” aprendem logo de início a ser tolerantes, e não se incomodar tanto com os defeitos, ao passo que as virtudes ganham especial realce, um holofote azul que lhes maximiza cada detalhe.
Os amigos verdadeiros são solidários, tomam nossas dores, sopram nossas feridas e celebram sem inveja as nossas vitórias.
É muito bom quando encontramos na vida, alguém que se encaixa em nossa história de forma sincera, descomprometida com outra razão que não seja a dos laços genuínos.
Paulinho Mota, um conhecido meu lá de BH capaz de frases inspiradas e colocações sagazes, costumava dizer, depois de umas cervejas, que só tinha amigos iguais a si próprio.
E emendava: um cachorro cheira o outro, pelo rabo.
Os iguais se igualam, sim. Os opostos se evitam.
Inimigos não se sentam à mesma mesa por prazer.
Negociam, assinam tréguas, armistícios, mas são água e óleo e não se misturam, verdadeiramente, fora desse contexto estritamente de formalidade.
Não possuo esse “software” e não consigo me relacionar com pessoas que me beijam pela frente, enquanto sei que corro o risco de ser apunhalado pelas costas.
Guardo no coração amizades raras, que cabem na mão.
Deus foi generoso comigo ao longo da vida. E mesmo não sendo absolutamente iguais a mim, esses irmãos gerados no ventre de uma outra mãe, acrescentaram muito ao meu viver.
Nos momentos de perrengue, das desilusões ou das necessidades, tive a ventura de ter ao meu alcance, uma mão firme para segurar, olhos que enxergavam o que eu não conseguia ver e me apontavam a direção correta.
Infelizmente, na caminhada da vida em busca de um lugar ao sol ou de um pedaço de pão, acabamos por nos perder dessas pessoas especiais.
Sim, sou meio estranho, admito. Sou capaz de ficar no frio esperando o primeiro bluejay da primavera. Converso com pica-paus, saúdo cardeais - elogio suas penugens terracota -, enxoto corvos do meu quintal.
Desde menino sou assim.
Encanto-me com pessoas que enxergam beleza em carrapichos, acham as açucenas as flores mais lindas do mundo, admiram-se com a imponência brejeira dos buritis e que preferem uma mesa de bar, a uma pista de dança.
Talvez seja por esse motivo que me identifique tanto com pessoas portadoras de dois pés esquerdos.
Sou absolutamente obcecado por música, por literatura e pelo ofício de rabiscar versos.
Dou um boi para não entrar numa briga e uma boiada para não sair dela. Identifico-me com os Quixotes desta vida, pessoas cujos moinhos de vento são reais.
Embora possa causar uma impressão errada com atitudes que possam parecer sofisticadas, à mesa gosto mesmo é de rapa de arroz, de pão com lingüiça e uma cachacinha de alambique. Quem me conhece bem, sabe de minhas preferências.
Escrevo isso tudo porque lembrei-me com saudade de Edson Balinha, absolutamente lelé da cuca, um amigo querido, que guardo do lado esquerdo do peito e de quem me perdi em minha caminhada.
Um sujeito com quem me identificava tanto, crescendo, que olhava-o, a transitar pelas ruas e me via, caminhando dentro de seus sapatos. Almas gêmeas, ele e eu.
Balas, querido, essa crônica é pra você.
Aonde você estiver.

1 comment:

Andrea de Godoy Neto said...

essa crônica me emocionou...

que maravilha quando encontramos essas pessoas "iguais", que mesmo diferentes, nos acolhem em seu peito, sabem ler o nosso silêncio, olhar o mundo através nossos olhos, sentir o chão sob nossos pés... essas pessoas que nos sabem, sem que precisemos lhes dizer...

um beijo, roberto!