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procuro-te no meio dos papéis escritos
atirados para o fundo do armário de vidrinhos
comias uvas no meio da página
a seguir era como se fosse noite
havia olhares que se cruzavam corpos
deambulações pela praia
era noite e alguém se aproximava
eu estava passeando os dedos
pelas nódoas frescas do vinho sobre a mesa o caderno
onde de quando em quando rabiscava um rosto
e listas de nomes que não queria esquecer
paguei o pão o vinho o queijo
levantei-me
tu cortaste-me a fuga vagarosamente preparada
pediste-me um cigarro
na outra página estávamos rindo
estendidos no pobre embarcadouro de madeira
planeávamos atravessar a noite mágica do rio
a página seguinte está em branco
mas lembro-me que te agarrei a mão e disse
todos os cigarros do mundo são para ti
(al berto)
A Música Que Toca Sem Parar:
o ator português Joaquim de Almeida (o Sherlock Holmes do filme baseado no livro O Xangô de Baker Street, de Jô Soares) escreveu este poema e o entregou ao seu compatriota Luiz Represas, um de meus cantores favoritos.
E desta parceria saiu a canção Enquanto Vivos, registrada aqui numa gravação ao vivo, durante espetáculo no centro Cultural de Belém.
Enquanto Vivos
(Joaquim De Almeida e Luís Represas)
Enquanto mortos e vivos
Enquanto
Enquanto vivos ou mortos
Nós somos
Os vivos que querem viver
Por enquanto
Temos os mortos que não tiveram tanto
Enquanto vivos
E vivos assim
Sentimos vozes
Por ti e por mim
Que a noite e o dia
Não cabem no sermos
De sermos o mesmo
De todos os dias
Enquanto caem palavras
Do cimo de torres
Gemidos do fundo de heróis
Vão calando a noite
Crianças de uniforme grande
Limparam o mundo de risos
Deixando espalhados nos cantos
Bocados de paz
Enquanto todos os dias
Nos vendem
O sofrimento de longe
Tão perto
Vão consumindo o azul
E as cores da terra
Sabendo nós que a paz
Não é só o contrário da guerra
Enquanto vivos
E enquanto formos
Grita a vontade
De deixarmos vivos
Os cheiros e as imagens
Que sentimos
E não só lemѢranças
Deixadas em arquivo
Enquanto morrem as arvores
O verde
Torna-se terra de corpos
De guerras.
Queremos tambores e guitarras
Voando nas ruas
Com a alegria da vida
Que não devia ter fim
28 comments:
Oh, gostos de que eu gosto.
Al Berto... Este poema para mim é "devastador"
E depois... Joaquim de Almeida e Luís Represas
Tudo bom!
todos os cigarros do mundo são para ti, como eu nunca pensei nisso. e tudo em combustão, uma fumaça titânica. há muito que desaprender com a poesia. abração
ô assis, e eu numa peleja titânica para deixar os cigarros.
tava pensando no outro dia sobre o primeiro cigarro.
fumei-o em muriaé, durante férias.
quantos anos tinha eu?
12, 13...rs
lembrei-me também do primeiro copo de cerveja.
e em tantas outras primeiras vezes.
estas, as derradeiras, sempre.
e o porquinho?
ce vai precisar do dindim pra se encontrar com a turma em minas.
abração, assis.
hoje tive essa recaída por luiz represas, que amo de paixão.
acho que é pela proximidade da reunião do trovante, semana que vem, no rock in rio lisboa.
e eu queria muitíssimo ir.
mas ja sei que não vou.
acho que essa é uma das primeiras vezes em minha vida de adulto que tenho vontade de fazer algo, de ir a algum lugar, e não vou.
como nunca ganhei bicicleta no natal, quando menino, vou tirar de letra. sei que me conformarei.
bom te ver aqui, lídia.
sempre bom te ver por aqui.
abração do
roberto.
"Enquanto morrem as arvores
O verde
Torna-se terra de corpos
De guerras."
versos para uma tentativa de paz
Assis falou certo: há muito o que se desaprender com a poesia, Manoel de Barros que o diga.
Mas fiquei cá com inveja, Roberto, é desse seu fazer tudo que tem vontade, isso não é regra. Mas é muito bom, coisa de ariano, mas você é sentimental demais pra ser ariano, deve ser um pisciano, canceriano...rs..sei lá!
abraços,
ediney,
paz é uma palavra tão curta,. né?
linda e óbvia.
mas "dificultosa" demais de ser escrita.
louco demais, isto.
bom te rever aqui.
caríssimo roberto, como te entendo... al berto, represas... esse saudosismo tem apenas uma explicação: hoje, rock in rio, as noites a reacender as estrelas e as gargantas a desprendem-se dos corpos que as aprisionam para se elevarem num olimpo musical. e nós não vamos estar lá...
um abraço!
ah, jorgíssimo... ontem fiquei nesse banzo permeado por uma crise de bronquite (rs)... essa namorada que não larga do meu pé (digo, pulmões)...
e todos os cigarros foram pro trovante, logo mais.
vou me aprumar, comprar tijolos e fazer um contorno à volta de uma árvore. como um daqueles poços artesianos.... cisternas... cacimbas...rs
como se chama mesmo isso aí no minho? rs
abração, poeta bracarense.
r.
ps: "o bracarense" era o botequim favorito de tom jobim no rio de janeiro.
tom ia lá pelo chope de colarinho branco tirado do jeito certo e na temperatura exata...
e pelos bolinhos (pastéis, em portugal, né?) de bacalhau.
tânia,
sagitariano... acendente?
... zippo...rs... ôlho (com acento)... pinheiro (daquele em caixinha, contendo 40 palitos... da fiat lux)... algo assim.
ó, essa semana to meio lusco fusco... e tava até comentando aqui em casa, após o jantar: acho que é a primeira vez na vida adulta, que não faço uma coisa que me deu na telha fazer (eu queria muito ter ido a lisboa ver um show)...
mas uma porrada de fatores me desestimulou e eu espero, pro meu proprio bem, que não passe o resto da vida com aquele manjado "por que não fui? por que não fui?"...
obviamente, meus arroubos são menores, se comparados aos arroubos de tanta gente que pisa o cimo da terra... minhas excentricidades são um uma partida de futebol entre amigos, um pão com mortadela no mercadão de são paulo e uma lua cheia sobre o tejo na noite de hoje...
não desejei um tsunami.
ou um ano naquele hotel carinho de dubai.
ou uma noite de amor com a juliana paes... rs
sempre vi felicidade em ir onde quero ir, fazer o que gosto, escutar, comer e beber o que me apetece.... e por aí afora...
e essas coisas você só consegue "bancar" (não no sentido granesco da coisa) andando com suas próprias pernas... primeiro, plantando os pés no chão... afinal, é preciso "firmeza".
parafraseando e maculando o poema letra de canção, "sou feliz e sei"...rs
embora hoje não esteja sendo muito...rs
mesmo assim, não dá pra me aperrear demais por não ter ido a lisboa... por não ter ido ao show... quem sabe ainda não ganho uma segunda chance?
ah... manuel de barros?
gênio da raça. esperança. sofisticação residente na simplicidade. pura poesia.
beijão, tânia.
...
Ótimas escolhas,
Meu caro amigo Roberto.
Meu abraço.
...
julio,
passei varias férias em balneário camboriú. meus sogros tem um apartamento aí.
gosto da cidade. guardo boas recordações daí.
o mercado de itajaí ficou bonitinho, né?
qualquer dia deste bebemos uma cervejota por aí.
abração do
roberto.
Caro Roberto, o Máquina Lírica foi um dos blogs a receber o Selo Prêmio Dardos. Deixei a minha contribuição: a dificílima seleção de 15 blogs da lista de meus 42 preferidos. O Primeira Pessoa foi um de meus escolhidos! Deixo aqui a minha admiração por tuas palavras. Confira o prêmio no Máquina Lírica.
Um abraço!
poxa, luciana.. so me resta agradecer.
o máquina lirica é um dos meus blogs favoritos.
acho lindas as suas colagens, suas palavras escolhidas a dedo, suas imagens..
tudo permeado por sensiblidade e bom gosto.
como diria leminski (mas devidamente melhorado) iremos além.
muito além.
estou péssimo, confesso. hoje eu queria estar em lisboa. e não aqui, dentro de meus sapatos.
felizmente, amanhã é domingo.
beijos procê.
Roberto
Li seu perfil e me identifiquei co tantas coisas que não pude deixar de estar aqui e não me arrependo, ótimo blog, por isso passo hoje a posição de seu seguidor. Quando quiseres passe lá no meu Blog para uma visita.
Abs
caro amigo,
cá no minho temos o furo artesiano, a mina, o poço, a albufeira, a barragem, a cisterna... (a cacimba é apenas a orvalhada da noite :) ), mas também temos as caves, as adegas, as garrafeiras, os alambiques... :)
de sobremesa, temos mesmo os bolinhos de bacalhau (pastéis é mais no sul) e mil e uma receitas outras com esse que por cá é conhecido como "o fiel amigo". há mesmo uma à braga, que é amicíssima do palato, mas, sobretudo, do colesterol, hehe.
um abraço e as melhoras!
p.s. está na hora de trocar de namorada, não? :)
gilson,
agradeço a visita que, sim, será retribuída.
seja bem vindo ao blog.
você está entre amigos.
abs,
r.,
ah, tá... jorgíssimo... rs
uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa...
de todas, gostei mais da albufeira. aliás, tem a cidade ribatejana com esse nome, né?
to deixando os cigarros aos poucos, o que não tem sido fácil. antes, eu parava quando queria. voltava por uma noite. ficava dias, meses, às vezes anos sem tocar num cigarro...
ultimamente, é o cigarro quem me fuma.
doido demais, isto.
hoje vou assistir um joguinho de futebol (a juventus jogará contra a equipe daqui de jersey, o red bull à uma da tarde)... mas ja deixarei o rango engatilhado pra volta à casa...
pargos temperadinhos no tomilho, alho e vinho branco... esperando apenas o calor do forno para se bronzearem... rs
salada russa...
e salada de tomatinho-uva com mini-rúcula orvalhada de vinagre balsamico e azeite...
e só.
ah, uma taça (ou duas) de vinho branco... um chardonet californiano bem honestinho...
e tentar, dentro do possível, ter um bom domingo.
abração, poeta!
Roberto, ler versos de poetas d'além-mar no seu Primeira Pessoa está se tornando um vício.
Cabra bom esse Al Berto.
Esses versos são supimpas:
"a página seguinte está em branco
mas lembro-me que te agarrei a mão e disse
todos os cigarros do mundo são para ti".
Belo demais.
Meu caro amigo e irmão, excelente semana. Aquele abraço.
Achei seu blog através do blog (Canto Geral do Brasil), que é um dos meus seguidores, e curiosamente percebi que vc também é um mineiro da "gema" uai.
Resolvi seguir seu rastro e conhece-lo melhor; descobri que foi mais um de tantos que saiu a procura de aventura e conhecimento porém não nega suas raizes.
Um dia também fiz o mesmo. Espero que, a partir de hj possamos iniciar uma nova amizade, mesmo que virtual.
Para tanto, quero convida-lo a conhecer:
http://serrademinas.blogspot.com e
http://kidureza.blogspot.com
Abraço conterrâneo
Olá, Roberto!
Mesmo chegando atrasado, aqui só tenho ganhos, como essas notícias reveladoras sobre poetas portugueses. Nossa!
Curiosamente, ao ler o poema-letra do Joaquim de Almeida me lembrei, talvez por contraste, daquele impagável coronel (será mesmo coronel?) Gervásio que ele interpretou no excelente Capitães de Abril, da Maria de Medeiros. Um tipo desiludido, pessimista e algo cínico que não parava de esquentar com sua ladainha,os ouvidos de um capitão idealista.
Olhe, esse diálogo com o Jorge Pimenta é um bônus para o leitor? (Rs).
Ah, o tema do cigarro é sempre uma alfinetada dolorosa na minha consciência. Já havia me sentado aqui, me lembrando que preciso sair para comprar o infeliz.
Abração.
marcantonio,
jorge pimento é um cara lindo. eu nao tive um professor como ele. tivesse tido, teria sido perigoso.
sei que teria sido.
pois bem... o cigarro... o cigarros...
é o o cigarro que me fuma. cheguei à esta conclusão ontem.
e, sua presença, aqui, um luxo. sempre um luxo.
precisamos nos encontrar um dia destes, antes que paremos de fumar.
abração
robero.
Bela letra e bela gravação!
Ah, Roberto, adoro este poema!!!
Boa semana!
Beijos
Laura
darwinson,
qualquer dia destes postarei aqui uma de suas belas canções.
puro merecimento seu.
bom te ver por aqui.
abração do
roberto.
laura,
você tem extremado bom gosto.
fico feliz de saber que acertei na escolha do poema.
abraço grande do
roberto.
Al Berto é sempre uma escolha fantastica.... e eu venho aqui sorrir "ouvindo" as tuas conversas com o Jorge :)
Tenho de mandar-te Trovante...
Beijo
pois é, magnólia... fiquei sem ver a reunião dos trovante.
quem sabe eles ainda não se juntam uma vez mais? quem sabe?
se eles fizerem outra reunião, quero me programar direitinho e ir.
infelizmente, desta vez, fiquei a ver navios...
abração pra você.
r.
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