Friday, April 2, 2010


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Survivor, Brazilian Style

Fim de domingo, estatelado no sofá da sala, brincando com o controle remoto da tv, deparo-me com o Survivor, um reality show em que os participantes são despachados para um canto esquecido do planeta e tem que se virar nos trinta, como recomendaria o Faustão.
Passam cerca de 40 dias embrenhados na mata, vivendo em abrigos improvisados, caçando e pescando para comer com lanças feitas de madeira, extraem fogo de pedras, como na pré-história.
Mauricinhos, caipiras, aspirantes a modelo, desajustados, cowboys de meia-espora, manicures, donas de casa e pessoas de diferentes regiões do país são divididos em duas turmas e o bicho pega, com a realização de provas de sobrevivência que contam pontos e dão prêmios cobiçados como uma caixa de cerveja gelada, um café da manhã com direito a bacon e croissants, um canivete suíço ou uma sempre disputadíssima caixa de fósforos.
Uma vez por semana, os participantes votam pela saída de um dos seus. E assim eles vão se dizimando, canibais de si próprios, até que seja apontado o vencedor.
O Brasil teve uma versão deste enlatado, que parece não ter emplacado muito bem, ao contrário do Big Brother, que virou mania nacional, transformando nulidades em celebridades e recheando as páginas das revistas masculinas de “carne novinha em folha”.
Abomino o Big Brother.
Não o assisto por aqui, não o assistiria se vivesse no Brasil ou em qualquer outra parte do mundo onde se fabricasse sumidades do quilate de Alberto Cowboy, Diego Alemão e o filósofo Cléber Bambam, aquele que fez o país inteiro dizer “faiz pairte”.
Como sei o nome destes e de tantos outros big brothers?
Ora, como não saber?
Em época de Big Brother, eles ganham mais espaço na mídia do que o lançamento do livro de Chico Buarque, o mais recente poço de petróleo descoberto à unha por Lula ou o novo escândalo político em Brasília.
Aliás, político deve adorar o Big Brother.
Isso é garantia de que o olhar de quase 200 milhões de brasileiros está nas coxas de beldades do calibre de Sabrina Sato ou de Pryscila, uma indiazinha bem bonitinha do Mato Grosso, que mostrará seu piercing genital na próxima edição da Playboy.
Quem quer saber de mensalão, mensalinhos e deputados donos de castelos, quando o país inteiro rói as unhas para saber quem vai sair da "casa"?
Mas eu falava do Survivor (O Sobrevivente, para os recém-chegados e ainda não familiarizados com a língua inglesa)...
A edição deste ano foi realizada no Brasil.
Para ser mais exato, em Tocantins.
Entre muriçocas, rios infestados de piranhas, aranhas caranguejeiras, cobras de todos os calibres e feras da fauna brasileira, a turma se engalfinhou pelo direito de levar para casa a bagatela de 1 milhão de dólares.
Fiquei pensando, enquanto admirava a belíssima paisagem que servia de pano de fundo para o programa, se a produção precisava mesmo tê-los mandado para os cafundós de Tocantins, quando a intenção era testar a resistência física e mental dos participantes.
E minha mente desocupada passou a bolar um Survivor brasileiríssimo, com provas bem mais difíceis para os participantes, do que atravessar rústicas pinguelas com os ombros carregados de balaios d’água.
Queria ver essa turma passar pelas provas diárias dos legítimos survivors brasileiros.
Para começo de conversa, queria vê-los alimentando uma família de 5 pessoas com um salário mínimo, como fazem milhões de pessoas.
Pensam que é moleza?
Como prêmio para a equipe vencedora dessa prova, caberia um bolsa-família.
Embarque um mauricinho novaiorquino num lotação em São Paulo às 5 da manhã e, após repetir esse processo mais duas vezes todos os dias, deixem-no guardando carros numa avenida paulistana.
Uma patricinha, dessas aspirantes a modelo, enviem-na para uma casa de madame, e a deixem lá, uma semana inteira, comendo o pão que o diabo amassou com o rabo.
Esse countryboy do Alabama que venceu o Survivor no último domingo, eu mandaria para uma plantação de cana no sertão de Pernambuco, e veria a veridicidade de sua familiaridade com os outdoors, esse que supostamente foi seu passaporte para a vitória.
Ao invés de comerem peixe cru (quem não gosta de um bom sushi?), coloquemos em seus espetos um bom acarajé, testículos de boi, buchada de bode e eles iriam mudar o nome do programa para Fear Factor, the Brazilian Edition.
Uma outra prova seria parar o carro de janela aberta, após as dez da noite, num sinal de trânsito de qualquer capital brasileira.
Outra prova dificílima seria trancar todo mundo num quarto assistindo os programas de Ratinho ou de Luciana Gimenez.
Quem resistisse mais tempo, ganharia o cordão de imunidade até 2020.
Numa das provas de resistência mais difíceis, mandaria os participantes para Jaguariúna ou Barretos e os deixaria lá por dias a fio, sentados em confortáveis cadeiras no centro da arena de rodeio, assistindo a shows
consecutivos de Zezé di Camargo e Luciano, Leonardo, Daniel, e Bruno e Marroni.
Para dificultar um pouquinho mais, mandaria os finalistas vestirem uma camisa rubro-negra, os soltaria no Maracanã, bem no meio da torcida do Vasco, gritando Mengôôôô…
Quem sobrevivesse levaria para casa, merecidamente, o tão cobiçado milhão.


Foto de Sebastião Salgado, gênio do olhar


A Música Que Toca Sem Parar:
Celso Adolfo, O Tempo.

22 comments:

Anonymous said...

Boa crítica, Roberto. Eu também abomino programas como o Big Brother. Não assisti a nenhuma das edições, nesses dez anos, embora eu também conheça nomes de participantes - e uma participante pessoalmente: a Elenita, que foi minha professora no curso de Letras, na UnB. Eu acho que Big Brother é uma espécie de zoológico humano (só que os animais do zoológico normal são muito mais interessantes). São pessoas completamente diferentes, manipuladas para serem o que o programa quer que elas sejam, para dar audiência. Tire-se pela própria Elenita, que não é uma pessoa pedante ou arrogante, mas pareceu assim antes mesmo de o programa começar, por causa da chamada que fizeram. É triste ver pessoas se colocarem na situação de passar três meses trancados conversando sobre quem é mais falso ou quem está tramando contra não sei quem. E a música, a literatura, o cinema, a cultura? Essas pessoas realmente não têm nada a dizer, a acrescentar? Fico mais triste ainda que esse seja o programa mais assistido pela população brasileira: um povo alienado. No fim, acho que o Big Brother segue a política do "pão e circo". A diferença é que ele serve só como circo, enquanto a população (a maior parte pobre) gasta tempo e, inclusive, dinheiro, ligando para eliminar pessoas como gado no abate. Triste, muito triste.


Beijo.

Anonymous said...

Maravilha de crítica Roberto.
Fecho contigo.

Anonymous said...
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Anonymous said...
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Unknown said...

A cançãozinha é mesmo um primor, lembra Beatles ou melhor um bocado das baladas de Paul, que é mestre nesse tipo de música. Tô me empaturrando de vatapá nesta sexta santa. abraço.

Primeira Pessoa said...

putamerda, assis...
faz inveja, faz...
to terminando o expediente no jornal, fechando a folha de pagamento da turma, e já pensando no que farei quando sair daqui. talvez vá a um jogo de hockey no gelo (gosto muito e o time daqui, o devils, é o capeta de bom...rs)... talvez fique em casa...
talvez vá ao cinema...
to sozinho em casa, meu povo viajou pro que chamam de spring break e a casa ficou do tamanho do maracanã...
não sei o que fazer da minha sexta-feira...
se bem que todas as sextas poderiam ser santas, né?
e me entupir de vatapá e pato no tucupi, na pior das hipóteses, dá uma belíssima aliteração...rs

abração,
R.

Primeira Pessoa said...

fouad,
estamos triplicemente fechados.
como aqueles buracos de lata de azeite em restaurante de beira de estrada.
manja?

abraço carinhoso, do
R.

Primeira Pessoa said...

J,
não entendo nada dessa cultura biguebroda.
tudo bem, o milhão, me dirão...
e daí? - digo eu.

no concorrente A Fazenda (pelo que li), pelo menos as pessoas ali já são meio conhecidas... são estrelas de terceira grandeza e dá pra se ver, por exemplo, o dado dolabella colocando bolinha de meleca debaixo da mesa... rs

mas essa turma do big bunda? é tudo calculadinho... ó, na boa? esse ano tentaram levantar a "polêmica" da homofobia e essa discussão é válida. daí, o cara que ganha a bolada fala em rede nacional que heterossexual não "pega aids"?

esses desserviços, manja?
mas, como diria o filósofo kléber bambam, "faiz pairte".

não que eu me interesse, mas acho tudo uma merda.
pelo menos, serviu-me pra escrever uma crônica.

e tudo, inclua aí essa crônica, é a lesma lerda.
prometo arranjar um tema melhorzinho, no futuro.

abração do
roberto.

Anonymous said...

hahaha... Estão perdendo suas ideias. Luciana Gimenez já é apelação, Roberto! rs...

Beijo.

Primeira Pessoa said...

vou vender a idéia pra globo, larinha...
vai que eles vão na conversa?
rs...

abração do
roberto.

Sonia Parmigiano said...

Roberto,

Ótimo texto, como sempre!!Parabéns!

"A Páscoa não é apenas um momento de reflexão, mas de renovação, da fé, dos costumes, de nossas atitudes diante do universo que nos rodeia."

Boa Páscoa!!

Beijos,

Reggina Moon

Jorge Pimenta said...

Ena, Roberto, esse teu olhar é mesmo clínico. Adorei o movimento subtil que fazes desde o reality show até ao show da realidade e a que nenhum de nós consegue ficar indiferente.
Um abraço desde Braga!

P.S. A sexta já passou (a equipa de hóquei ganhou? :) ); ainda bem que já é sábado! :)

líria porto said...

na sexta-santa (?) imploro aos deuses - livrem-nos de todas as porcarias... televisivas, literárias, visuais!

será que o mundo acaba em quê, betinho?
besos

Primeira Pessoa said...

Jorge,
meu time perdeu nos "penaltis". Vi pela tv, de casa.
sim, já é sábado, amigo de Braga.
e amanhã é domingo. e a vida é, às vezes, uma mera sucessão de dias.
mas tem um sol de primavera lá fora. luminoso e belo. vou descolar uma ajuda pra retirar do gramado as avelãs que caíram durante o inverno.
vou comprar umas sementes pra minha horta. é chegado o momento de plantar meu verão.

abraço afetuoso,
desde New Jersey.

R.

Primeira Pessoa said...

lírica,
o mundo não acaba ainda, minha querida.
estamos nos transformando em peixes do Arrudas, respirando com dificuldades no meio dessa imundície toda.

mas somos peixes, ainda.
nós, do Arrudas.
do mundo.

beijão, lírica.

R.

Primeira Pessoa said...

regina,
só tem uma coisa da páscoa que não entendi até hoje...rs

"desde quando coelho bota ovo? e de chocolate?"

só uma coisa nào se discute: o espírito da páscoa é maravilhoso.

que a sua páscoa seja maravilhosa!

abração,
roberto.

Em@ said...

Excelente crítica , Roberto. Aqui também houve uma série desses programas e um horroroso chamado "fiel ou infiel" de um luso-brasileiro , joão kléber de nome. Vi um bocadinho de cada um deles e fiquei vacinada.

Deixo-lhe um abraço e votos de renovação interior. dias mais claros, noites criativas,saúde e Paz.
Boa Páscoa.

Primeira Pessoa said...

Em@,
esse joão kléber foi a pior "importação" portuguesa em toda a sua história...rs

nós, brasileiros, não aceitamos devolução.

boa páscoa!
abração.
R.

Jorge Pimenta said...

Ahahahah! Esse João Kléber caiu aqui de pára-quedas, sim... infelizmente colou, pois cá como aí ainda há muitos pobres de espírito que alimentam a mediocridade. Enfim...
Avelaneiras no quintal? (haverá maior proximidade com o lirismo trovadoresco que o bailado sob as avelaneiras, amigo?). Pois, eu tenho um diospireiro (é, mesmo, a árvore de melhor fruto, para mim) há seis anos e só este ano medrou e ofereceu uma amostra do que pode valer. mínima, mas muito boa, mesmo! Quando cá venhas, dar-me-ás o privilégio de to demonstrar.
Um abraço, Amigo!

Wilson Torres Nanini said...

Roberto, muito boa crítica! O mais abissal do BBB, foi uma coisa que li na net do Pedro Bial dizendo que o BBB é de cultura proporcional à ofertada por um carinha chamado João Guimarães Rosa (conhece o cara?). E que se dê ópio ao povo, que o povo merece, aliás: é mais sábio aquele que teceu: o povo tem os políticos que merece.

Abraços!!!

Primeira Pessoa said...

Wilson,
o mais louco é que conversei com uma pessoa da Globo (transito com certa facilidade no braço internacional da emissora) e os caras dizem que Bial acredita mesmo nisso...
será?
poxa, esse mesmo Bial que, já jornalista renomado, que participava de recitais de poesia, ajudava a prover lançamentos de livros... enfim...
como diria a letra de Sampa, "é a força da grana que ergue e distrói coisas belas".

Guimarães e BBB?

pelamor de Deus... rs
isso me faz me lembrar de uma crônica de Drummond (o Carlos) em que ele dizia que alguém escreveu algo no jornal e reputou a Rubem Braga, que escreveu uma missiva, furioso, ao jornal:
"não pronunciem o meu santo nome em vão"...rs

é mais ou menos por aí.
vou te madar uma foto que tirei na casa-museu de guimarães, em cordisburgo, em janeiro último: a máquina em que ele escreveu O Grande Sertão Veredas.

abração, poeta.

R.

Primeira Pessoa said...

Jorge,
já disse: não aceitamos devoluções... fiquem com essa João aí...

Rapaz, avelã é um dos nomes mais lindos que conheço, mas as castanhas espalhadas pela grama são um porre. Descolei uma ajuda pra a remoção benéfica ao cresimento da grama, mas adiei até o próximo sábado, pois parei num restaurante chinês, a caminho de casa e aí, amigo... me perdi... sem sair do lugar.

agora, vou tirar uma nada merecida soneca.

abração,
R.

ps: quando eu for ao Minho, quero, sim, conhecer seu diospireiro. e vou cobrar! rs