Friday, December 4, 2009

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Aquele incômodo dedinho que dói

Quando estamos tristes, tudo fica pior. É como quando estamos com um dedo do pé machucado e temos aquela impressão de que sempre o estamos batendo pelos cantos por onde passamos.
Não percebemos que sempre o batemos pelos cantos, desde que nascemos e aprendemos a caminhar, mas que não o sentimos porque ele só dói, quando realmente está machucado.
E não estamos com o dedinho do pé machucado, sempre.
Ou estamos?
Quando estamos nesses dias plúmbeos em que o corpo inteiro se transforma num grande dedinho machucado, ficamos expostos demais, sensíveis demais, fragilizados demais.
Um engarrafamento no trânsito torna-se uma calamidade de proporções tsunâmicas, a derrota do time de coração trucida tanto quanto a perda de um ente querido, e por aí vai.
Só dói quando eu respiro, posso afirmar. Por isso tento aprender a respirar mais miudinho.
Ando meio assim ultimamente, de braço dado com a tristeza, enamorado dela, mas pensando numa possibilidade de fugir do altar.
Dona Tristeza que fique solteira!
Meu médico falou em depressão. Recusei o diagnóstico.
Depressão é coisa de bacana. Ando triste. E pronto.
E não adianta culpar a descoberta de que Obama não é Superman, que os impostos aumentaram e as benesses escassearam, que o verão foi um arremedo ou que ganhamos mais uma nova ruga e acumulamos outros fios brancos entre os cabelos que restaram.
Não tem jeito.
Às vezes penso que nascemos com esse gen da dor, e que passamos a vida inteira tentando dar-lhe um nó.
Inventamos paixões, as transmutamos em amor, fazemos filhos, depositamos neles a esperanças de que sejam tudo aquilo que jamais seremos, devoramos livros, viajamos pelo mundo, pregamos diplomas na parede, nos empanturramos de lagosta e vinho.
Quando não dá para tanto, mastigamos couve e arrotamos caviar.
Tudo para driblar o gen da dor. Nem sempre conseguimos, obviamente.
Quem não tem o suficiente para pagar o analista – ou não acredita nisto -, tenta arranjar uma comadre.
Conversar faz bem, eu sei. Mas anda cada vez mais difícil encontrar alguém que nos escute mais do que tenha para dizer.
Hoje em dia todo mundo tem tanto a dizer... E nem tudo nos faz sentido.
Terei me tornado egoístas demais?
Na falta de grana pro analista ou de uma comadre para chorar em seu colo, dei de falar sozinho ultimamente. Mas nem eu próprio tenho tido paciência para tantas lamentações.
Religião, não. Obrigado.
Deus deve estar com a agenda cheia. E a fila é enorme.
E, pegar fila é outra coisa que deprime qualquer cristão. Mesmo cristãos não tão cristãos assim, como esse do dedinho machucado que batuca no teclado desse computador.
Reaprendo na marra, a ‘catilografar’ com o dedo indicador.
E assim termino mais um texto.
E assim eu venço mais um dia.
Pode ser que amanhã já não doa tanto. Pode ser até que já não doa mais.

*

4 comments:

líria porto said...

lágrima
líria porto

a tristeza
tem sangue transparente

quando a dor extrapola
a ferida vaza
: dá alma aos olhos

*

besos

Primeira Pessoa said...

Já estava sentindo falta dos seus posts... e dos poemas...
bom recebê-la, sempre, Líria.

não há doril (nem dorflex) que faça sumir certas dores. concorda?

abraços do
Roberto.

Babi Burdett said...

Quando temos essa dor... podemos fazer uma linda viagem pela a Europa, que continuaremos triste e nem iremos apreciá-la... mas quando estamos bem por dentro, censeguimos sentir alegria numa tarde chuvosa, tomando um cafezinho meio amargo com pãozinho de queijo e assistindo um filme repetido da sessão da tarde! rsrs

Quando a dor vier... o jeito é esperar que o tempo cure...

Abraços e um bom fim de semana!

Primeira Pessoa said...

é verdade, Babi.
só que, às vezes, a dor chega e faz morada.
visitinha sempre indesejável, a da dor.

visita bem vinda é a sua.
obrigado ppor ter passado pelo blog.
abração do
Roberto.